[coletar outros modos de dizer]
Sentido Comum
- Abster-se de ter opiniões é um dos pontos mais frisados pelo Olavo ao longo das aulas - e desde o começo.
- Complicações
- 1- Geralmente a complicação é a seguinte: se de um lado Olavo recomenda não ter opiniões, de outro estudar um conteúdo diferente implica entrar em conflito com as opiniões vigentes, de modo que o aluno fica sem saber se deve engatar numa discussão, fugir dela ou participar só por curiosidade, sem intenção de ganhar. O primeiro parece ferir o exercício, o segundo gera a complexidade de "faltar com a verdade" [geralmente usam uma suposta citação de Dante, "no inferno os lugares mais quentes são reservados àqueles que escolheram a neutralidade em tempos difíceis", ou, complementarmente, Pôncio Pilatos], o terceiro requer muito auto-controle porque causa um estresse desgraçado.
- 2- Essa proposta parece ser auto-contraditória: se uma pessoa deve falar com a própria voz, isso não implicaria ter ideias próprias? E ideias próprias não são opiniões? Então como fazer o exercício da própria voz sem emitir opinião, ainda que seja para si próprio? Mas ele também diz que devemos ser uma "metamorfose ambulante", e mudar de opinião com frequência, o que parece indicar que não é propriamente não ter opinião, mas sim ter milhares, deixar que as ideias surjam e desapareçam e evoluam, em paralelo com a aquisição de conhecimento.
Sentido Extra
- Percebi na aula 510 e no ensaio "Introdução a um exame de consciência" em que Olavo introduz Carpeaux no compilado de ensaios deste pela Topbooks que parece haver um sentido a mais nessa proposta. Esse sentido é o seguinte: alta cultura parece ser ter várias opiniões sobre um tema de modo que, visto por um observador externo, você pareça estar se contradizendo, mas, na verdade, você está apenas expondo aspectos diferentes do problema.
- Complicações
- 1- Essa ideia é obviamente esquisita, então vou expor um exemplo meu. Se vem alguém de esquerda me falar mal de evangélicos, como aliás tem aos montes, é puro clichê já, eu retruco e o ataco, de modo a parecer que eu sou a favor de evangélicos. E quem me vê aí, pensa até que sou evangélico. Se, porém, um evangélico atacar outro grupo, como católicos, diante da questão das imagens, eu o retrucaria com a mesma chama de acordo com o que sei de verdadeiro sobre o assunto, e, para ele, eu seria católico. Se, porém, um católico me vem falar mal de ateu, do mesmo modo eu posso retrucá-lo justificando por que alguém vira ateu na sociedade da gente, seja no geral, seja no caso particular em que conversemos. E, para o católico, igualmente que lhe parecerei ateu ou hostil à religião. E na verdade o que eu sou? Ser e ter opinião se confundem na imagem comum, é o que Olavo chama de "vestir-se de opiniões", ou "depender delas para formar sua auto-imagem". E então você volta à pergunta: "e o que você é?" Ora, eu sou a pessoa que sabe disto, disso e daquilo. "Mas o que você é?" E importa?
- 2- Esse desenvolvimento dialético [?] é a base, parece, da educação, mas é esquisito, e difícil de desenvolver. Eu não tenho conhecimentos suficientes para afirmar com força, mas parece ser o que Agostinho fala em confissões no Livro III capítulo 7, onde ele descreve que a lei de Deus é a Justiça, e que as nações cada qual se baseiam de acordo com o tempo e suas características próprias. Na aparência, as leis mudam, mas a fonte do "Justo" é a mesma, e é só retornando a ela progressivamente que é possível julgar. É análogo ao caso da Complicação 1: "Se omito todas estas opiniões, o que eu sou?" A fonte é a mesma (eu), mas parece contraditório. Parece algo similar, pelo pouco que entendo, às ideias de Platão, isto é, uma fonte estática, o geral, a partir da qual os particulares se formam, cada qual a seu modo, mas feitos "à imagem e semelhança" da fonte. Para chegar a isso é preciso treino, não sei do quê, mas Olavo propõe que comecemos com ele: ao invés de julgá-lo pela opinião A que ele expressa, o que nos fará ter uma opinião X de que ele "é" A, precisamos nos abster para, pelo exemplo dele, entender o que é esse jogo dialético, o que é esse tipo de pessoa que tem essa "fonte" da qual as opiniões são só aparência.
Leituras auxiliares
- Eu me recordo de ter começado a enxergar essa questão no Mênon, diálogo de Platão. Foi como se um interruptor tivesse acionado na técnica que Sócrates vai usar diante do Mênon. Mênon, que era grande "professor" (sofista) que discursava sobre virtude, ao ser questionado por Sócrates, propõe que virtude varia de acordo com gênero, idade etc., então a virtude do rapaz é diferente da mulher, e esta diferente do homem bebê, que é diferente da do homem velho. E faz sentido, não faz? Mas, e o que é Virtude? Isto é, existe uma coisa que está contida e gera todas essas "virtudes particulares", isto é, existe uma "fonte"? E que se você aprende o que é e adquire essa Virtude, você será virtuoso, independente de gênero e faixa etária? Leiam e descubram. Eu não lembro.
- Confissões de Santo Agostinho, no Livro III Capítulo 7. (e livro III em geral)
- Aula 510 do Olavo, na parte das perguntas em que ele vai falar da técnica de Hegel e como isso passou para Marx, e como gerou a situação presente.
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